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O 2° Mandato de Trump: A Incerteza de um Cenário à Base de Tarifas e Ameaças

  • Foto do escritor: Grupo de Negócios da Escola Politécnica da USP
    Grupo de Negócios da Escola Politécnica da USP
  • 29 de abr.
  • 5 min de leitura

Após a posse de Donald Trump em 2025, muito se especula sobre o futuro da principal potência global. Mas como as políticas econômicas do republicano podem afetar o Brasil e o mundo?


Gabriel Ayub (Júnior no GN Poli)


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Com o posto de maior economia do mundo, é comum que acontecimentos e repercussões dos EUA estejam sempre em pauta. E, após uma vitória incontestável dos republicanos nas últimas eleições (fortalecida por um grande apoio popular que lhes deu controle sobre ambas as câmaras do Congresso), o segundo mandato de Donald Trump deve trazer mudanças significativas para a economia global, e o Brasil não ficará imune a esses efeitos. Entre riscos e oportunidades, o impacto das políticas tarifárias, oscilações cambiais, juros e embates geopolíticos deve moldar a trajetória do país nos próximos anos, mostrando uma face ainda mais agressiva e incisiva do que a vista durante sua primeira passagem presidencial.


Logo no início de sua nova administração, o recém-empossado presidente já enfatiza a influência que seu país detém quanto a negociações e retaliações. Em uma notória demonstração de poder, destacou também que os países da América Latina, incluindo o Brasil, dependem mais dos EUA do que o contrário.


E, de fato, sob a perspectiva brasileira em 2024, os EUA foram o segundo maior parceiro comercial do Brasil, com mais de US$ 80 bilhões comercializados bilateralmente no ano. Mas, sob a perspectiva americana, o Brasil representa apenas o 9º maior importador e, pior ainda, apenas o 18º maior exportador dos EUA. Isso conferiu ao Brasil um déficit de US$ 253 milhões no balanço comercial com os EUA, que vendem mais do que compram nessa relação desde 2009.


Balança comercial do Brasil com o EUA em US$ bi (Fontes: ComexStat, MDIC)

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É justamente por conta desse déficit comercial que o Brasil se encontra menos vulnerável e/ou suscetível a taxações diretas por parte de Trump, já que tais medidas estão sendo instauradas a fim de equilibrar balanças comerciais nas quais os EUA têm déficit, e não superávit. Exemplos disso são o que ocorre com China, México e Canadá, que, respectivamente, tiveram superávit de US$ 296 bilhões, US$ 172 bilhões e US$ 63 bilhões em relação ao país norte-americano em 2024.


Balança comercial do EUA com pares em US$ bi (Fontes: E-Investidor, BBC)


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O primeiro deles sofreu com uma sobretaxação confirmada de 20% sobre todos os produtos chineses. Já os outros dois, que, junto com os EUA, mantinham um acordo de livre comércio desde 1994, estão sendo intimados com uma sobretaxa de 25% sobre todos os seus produtos (mesmo que esse projeto de taxação já tenha sido confirmado e postergado duas vezes).



Com isso em vista, por um lado, o Brasil se blinda dessa taxação direta por conta de um déficit comercial e de uma posição com ativos estratégicos que lhe conferem certo poder de barganha (como reservas de minerais críticos, terras raras, matriz energética diversificada e uma posição geopolítica privilegiada). Mas, por outro lado, o país pode ainda ser afetado indiretamente por esse cenário geral de incerteza e taxações a demais países, que, no limite, leva à perda de todos, em uma desaceleração global.


Nesse sentido, é válido destacar certas diferenças entre as oportunidades que podem se abrir ao Brasil agora e as que já ocorreram no passado. Na primeira gestão de Trump, a estratégia de taxação trouxe consequências amargas para setores da economia americana e lucros para o Brasil. Isso porque, com a retaliação da China à soja e à carne de porco americanas na época, o agronegócio brasileiro teve espaço para crescer dentro desse gigantesco mercado consumidor chinês: a soja brasileira viu suas vendas saltarem de 40% para 80% do total consumido na China, a exportação de proteína suína brasileira mais que triplicou, e o Brasil tomou a liderança dos americanos como o maior fornecedor de milho para os chineses.


Mas hoje o cenário é um pouco diferente, e as novas taxas podem ter desdobramentos negativos para o Brasil, já que, tendo dominado a maior parte dessas commodities, há muito menos espaço para se expandir no mercado consumidor chinês. Além disso, com a China exportando menos para os EUA, ela deve precisar de menos produtos do Brasil, uma vez que sua economia, que se vê longe dos altos patamares da década passada, tende a desacelerar frente às tarifas.


Nesse cenário complexo, os impactos das tarifas extrapolam o mero comércio entre países, influenciando diretamente a inflação e o câmbio também. Com todo esse “tarifaço” de Trump e sua política protecionista, a economia americana deve enfrentar pressões inflacionárias, desencadeando um panorama complicado para o Brasil.


As tarifas mais altas tendem a aumentar os preços internos nos EUA, o que pressionará o Fed a manter os juros em patamares elevados para conter essa inflação. Com isso, os investimentos em dólar se tornam mais atraentes, levando à fuga de capital de economias emergentes como o Brasil, que registrou sua maior saída histórica de capital estrangeiro em 2024, chegando a incríveis R$ 24 bilhões.


Em parte por isso, o real já foi uma das moedas que mais perderam valor frente ao dólar em 2024, e a volta de Trump pode ampliar essa tendência. Com menos dólares circulando na economia brasileira, a pressão inflacionária por aqui tende a aumentar, forçando o Copom a manter ou mesmo elevar os juros para conter a crescente de preços, o que inevitavelmente torna o crédito mais caro e impacta o crescimento econômico.


E, se os impactos comerciais e cambiais já impõem desafios, os conflitos geopolíticos adicionam camadas de complexidade, deixando o Brasil diante de uma encruzilhada diplomática.


Apesar de Lula e Trump dizerem ter uma relação de “reciprocidade”, a postura de Trump frente a blocos como o BRICS, do qual o Brasil faz parte ao lado de Rússia, Índia, China e África do Sul, pode se tornar um ponto de tensão, principalmente nesses dois últimos anos do governo Lula. O republicano já ameaçou impor tarifas de até 100% sobre produtos desses países (o que, aí sim, impactaria diretamente as exportações brasileiras) e já demonstrou sua antipatia perante o governo vigente no Brasil, ao qual já se referiu como “lunático de extrema-esquerda”.


Complementando isso, a crescente influência de Elon Musk no governo Trump levanta outro problema quanto à relação diplomática entre os países. O bilionário, dono da rede social X e da SpaceX, tem um histórico de atritos com o Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil, especialmente com o ministro Alexandre de Moraes, que chegou a banir o X em agosto de 2024.


O risco, então, se mostra na escalada desse conflito que, com a volta de Trump e o enfraquecimento da regulação das plataformas digitais nos EUA, pode transformar um embate quase pessoal entre Musk e Moraes em algo muito maior, como um movimento das Big Techs contra o Brasil.


Resumindo, o segundo mandato de Trump representa um misto de desafios e incertezas para o Brasil. O protecionismo americano pode afetar negativamente a balança comercial brasileira, enquanto a política monetária do Fed pode gerar pressão inflacionária e cambial. Ao mesmo tempo, o país precisará lidar com os desafios impostos pelo alinhamento entre Trump e as Big Techs e o desalinhamento do republicano com o BRICS. Nesse difícil cenário, a chave para o Brasil será equilibrar suas relações comerciais e geopolíticas, mantendo parcerias diversificadas e evitando conflitos desnecessários.

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